“Meia hora de atividade física moderada – como uma caminhada – cinco vezes por semana aumenta a saúde e diminui o risco cardiovascular”, afirma Hélder Dores, especialista em Cardiologia Desportiva no Hospital das Forças Armadas. Em entrevista no Congresso Português de Cardiologia 2018, o médico recomenda a prática de atividade física, mas reitera a importância de uma avaliação clínica prévia.
Levamos um estilo de vida demasiado sedentário?
Vários estudos atualmente demonstram que independentemente de se praticar atividade física, o que se faz no resto do tempo também é importante na avaliação do risco
cardiovascular. Podemos fazer exercício todos os dias, mas estar sentados todo o
dia à frente do computador aumenta o risco de eventos cardíacos. No geral,
devemos fazer atividade física e também ter uma vida mais ativa: utilizar as
escadas em vez do elevador, passar mais tempo de pé…
O que está recomendado é fazer 150 minutos de atividade física por semana com uma intensidade moderada.
Na prática, se fizer 30 minutos cinco vezes por semana uma atividade moderada –
como uma caminhada rápida – aumenta a saúde e diminui o risco cardiovascular.
Que cuidados deve ter um indivíduo com patologia cardiovascular e que queira iniciar a prática de atividade física?
O exercício é benéfico, mas os doentes têm que ser avaliados previamente pelo médico assistente e também, de modo mais regular, quem faz exercício mais intenso.
Na prática, os médicos têm de ter em consideração vários aspetos antes de recomendar ou aprovar uma pessoa para exercício físico. Em primeiro lugar, saber se tem alguma doença cardíaca ou sintoma, se tem algum fator de risco, se é uma pessoa sedentária ou se já faz alguma atividade física.
Também é muito importante perceber se a pessoa quer fazer atividade ligeira a moderada, pouco frequente, ou se passa por exercício mais intenso e regular. Se o indivíduo não tiver sintomas ou história familiar de doença cardíaca, e se for já de certo modo ativo, muitas vezes não é necessário fazer exames complementares nem avaliações específicas. Caso contrário, a estratégia atual é pedir uma prova de esforço.
Exercício físico em excesso pode ser prejudicial?
Apesar de o exercício fazer muito bem, tudo o que é em excesso pode fazer mal. E o exercício em excesso também está associado a algumas alterações cardíacas patológicas. Por exemplo, um atleta com um patamar de treino muito intenso tem cerca de cinco vezes maior probabilidade de desenvolver fibrilhação auricular a longo prazo. Esta tendência também se verifica no que respeita à insuficiência cardíaca, à fibrose do miocárdio, eventualmente também à doença coronária.
Está muito na moda o exercício físico em ambientes extremos, de altitude, de profundidade (se em mergulho), de calor, de frio, etc. O ideal é que haja uma adaptação prévia, pois se a prova não tiver apoio médico adequado e não se mantiver os níveis de hidratação, pode ser o gatilho para um evento cardiovascular, numa pessoa com essa predisposição. Os atletas acima dos 35 anos devem ter um cuidado especial, nomeadamente, em situações de dislipidemia, hipertensão, diabetes, etc.
A Medicina Geral e Familiar (MGF) desempenha um papel fundamental na assistência às populações. Como cardiologista desportivo, o que gostaria de reforçar aos médicos-de-família?
É importante passar a mensagem de que o exercício é benéfico. Por vezes, os médicos, incluindo os cardiologistas, podem identificar como patológicas certas alterações no coração pela prática de exercício (que se manifestam nos exames complementares) e impedir o indivíduo de fazer exercício. Mas pode ser um chamado “falso positivo”. A Sociedade Europeia de Cardiologia tem alguns algoritmos que simplificam a avaliação as pessoas.
Se for alguém mais velho que queira iniciar a prática de exercício, deve-se pedir umas análises de rotina e normalmente um eletrocardiograma; se tiver fatores de risco, podemos pedir provas de esforço. Caso haja alterações, sintomas ou história familiar de
doença cardíaca, aí tem de haver referenciação [para a Cardiologia].
Essa ligação começa a funcionar bem. Há muitos médicos de família, sobretudo de uma
geração mais jovem, que gostam e começam a diferenciar-se em Medicina
Desportiva.
O Congresso Português de Cardiologia 2018 aposta, de resto, nessa
temática, organizando inclusive a III Corrida do Coração, aberta a congressistas e população.
A Sociedade Portuguesa de Cardiologia (SPC) tem um papel muito importante e temos de dar o exemplo. Há imensas ações que estão a ser levadas a cabo para promoção de atividade física em segurança, até em termos governamentais, com o Programa Nacional para a Promoção da Atividade Física, por exemplo. Acho que estamos mais atentos a estas questões.
Uma das bandeiras que a SPC elegeu foi o combate à morte súbita. As doenças cardiovasculares são as principais causas de morte súbita em atletas e estamos muito envolvidos em melhorar o tipo de prevenção que se faz durante as provas desportivas, quer no que respeita à disponibilidade de emergência médica, como também de desfibrilhadores automáticos externos.
Se fizermos uma prevenção adequada, além de melhorar a qualidade de vida e diminuir a mortalidade, temos um impacto muito favorável até em termos socioeconómicos. É muito mais barato prevenir com exercício físico do que tratar as complicações que advêm de eventos cardíacos.
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